
UM CONTO COTADO ASSIM
"O cadastro"
Nos dias de hoje as pessoas andam meio desesperadas,
querendo vender de tudo, comprar de tudo,
conseguir algum dinheiro, para isso fazem qualquer coisa.
O comercio para vender seus produtos ataca as pessoas,
aborda a todos sem cerimônia e já vai expondo tudo o que
acha que a pessoa precisa para comprar.
O mundo do comercio está totalmente enlouquecido!
Fazem qualquer cadastro, qualquer ficha a qualquer pessoa,
mesmo sem a pessoa querer e sem saber para que serve.
Cadastro para cartão de crédito, para empréstimo, para pesquisa, para sorteio, para vantagens sabe-se lá do que, é impressionante! Outro dia só porque me encostei num desses balcões onde
ficam desses atendentes, sem nenhuma intensão, veio logo
um moço me atender. Sem que eu pedisse-lhe nada, sem lhe chamar para ser atendido, o rapaz chegou e foi logo me atendendo.
Pegou duns papéis, desses de fazer fichas, cadastros e etc e começou a escrever. Enquanto preenchia o cadastro que não sei para que era,
me falava um monte de coisas, das ofertas, das promoções, das vantagens, dos benefícios, das promessas maravilhosas do mundo comercial. Escutava-lhe calado, observando o seu preenchimento e ouvindo suas palavras rápidas sem entender quase nada.
Por fim parou por um instante e perguntou meu nome.
Por educação resolvi falar, já que eu estava ali,
não havia problema algum.
-Machado de Assis. -disse-lhe.
De imediato começou a escrever meu nome nos quadrinhos
das folhas de cadastro. Mas percebi que ficou meu confuso,
talvez tenha achado estranho esse nome.
Olhou-me, certamente pensou em falar algo, não falou,
escreveu meu nome no papel.
-José de Alencar. -disse-lhe quando vi que havia terminado
de escrever o Assis.
-Como ? -indagou confuso, me olhando.
-José de Alencar. -repeti.
-José de Alencar ? -perguntou me olhando ainda mais confuso.
-não é Machado de Assis, o seu nome ?
-Sim. -disse e lhe expliquei- Machado de Assis, José de Alencar. -concluir.
Percebi que quis sorrir, mas conteve-se e completou o nome,
certamente pensando ser uma brincadeira. Quando acabou,
eu concluir o resto do meu nome.
-Cruz e Souza.
Nesses cadastros é preciso deixar o nome completo.
Pelo jeito que me olhou deve ter me xingado. Eu devia está
zoando com a cara dele. Ficou meio sem vontade de escrever
o resto do nome. Balançando a caneta na mão, me olhando sem
saber o que perguntar. Resolvi lhe ajudar, disse-lhe ser meu
nome de verdade, meu pai se chamava Machado de Assis, José
de Alencar. De imediato ele me perguntou:
-E Cruz e Souza ?
-de minha mãe. -respondi.
Não muito satisfeito completou meu nome na folha de cadastro. Passou-me os papéis e disse para falar com a moça no outro balcão. Peguei os papéis, ainda não sabia o que era aquilo, para que servia, mas resolvi ir até a moça. A moça me pareceu simpática, bonita, e para ser aprovado precisava passar por ela. O cadastro estava pronto, não me custava nada ir a moça. Me recebeu com simpatia, sorriso no rosto, entreguei-lhe os papéis. Olhou direto no meu nome.
-então senhor... Machado de Assis ?
-sim. -respondi tranquilo.
Percebi que quis sorrir. Talvez quando leu o resto do nome.
-José de Alencar. -quase num murmurio, ela falou.
-também. -respondi.
-eram escritores, não eram ?
-meu pai.
-os dois ?
-não! Quero dizer: meu pai me deu esse nome.
-mas os dois eram escritores...
-sim. Claro!
-e Cruz e Souza ?
-poeta.
-seu pai era poeta ?
-não! Cruz e Souza era poeta.
-então seu pai homenageou os três ?
-minha mãe.
-como assim ? O senhor disse que foi seu pai...
-Machado de Assis e José de Alencar, do meu pai. Cruz e Souza,
de minha mãe. Entendeu ?
-entendi. -respondeu meio confusa, me olhando de soslaio,
a moça olhava meu cadastro, que ainda eu não sabia se era
cadastro ou ficha e para que servia.
-então, senhor Machado, o que vai comprar na nossa loja hoje ? Aproveite nossas ofertas!
-nada!
-nada ?
-nada. Não preciso comprar nada.
-o senhor só veio fazer o cadastro...
-é... fiz! O moço ali insistiu tanto...
-o senhor trabalha no que ?
-não trabalho.
-não trabalha, senhor Machado ?
Me olhava de soslaio, indagativa, me prescrutando, revirando
os papéis do cadastro nas mãos.
-não. Sou aposentado. -respondi.
Fixou os olhos em mim, pareceu espantada.
-aposentado ? Mas me parece tão moço. Não tem registro
em carteira ?
-não.
-comprovante de renda ?
-não.
-e o comprovante da aposentadoria ?
-não tenho comprovante.
-como assim ?
-não recebo comprovante. Eu mesmo me aposentei.
Por conta própria. Resolvi não trabalhar mais. Então estou aposentado.
-entendi... -murmurou a moça, olhando-me de lado,
quando colocou os papéis sobre o balcão e disse: -já que o senhor
não tem comprovante de renda...
-não posso me cadastrar ?
-infelizmente, senhor Machado... não posso aprovar o seu
cadastro sem um comprovante.
-tudo bem.
-mas se o senhor quiser, volte aqui outra hora, traga um
comprovante de renda que nós aprovaremos o seu cadastro.
-obrigado, moça.
-de nada.
Antes de sair da loja, um outro fazedor de cadastro me parou,
com sua prancheta na mão e uma caneta.
-Já fez seu cadastro ? Vamos fazer ?
"UM CONTO CONTADO ASSIM"
-O cadastro-
"sexta-feira, 02 de abril de 2010"
"Autor: Pedro Aruvai"
5 comentários:
OLá...
Bem vindo em meu blog e em meu coração.
Tu já sabes que te gosto e que já te sigo em outro blog,não é?
Li o teu conto e tens toda razão.
Beijosss...e FELIZ PÁSCOA e nada de fazer cadastro...rsrsrsrsrs...ainda mais sem comprovante de renda...rsrsrsrs...snr.poeta...rsrsrsrs...
Bem vindo sempre amigo.
Amei seu conto...Parabéns!!
Abençoada e Feliz Páscoa!!
No silêncio do jardim pode se ouvir preces estampadas em pétalas e galhos, se as folhas murcham, uma sorri a outra como se rogassem o frescor do orvalho.
(Sirlei L. Passolongo)
Feliz semana....Amor & Paz!
obrigado, Crista, pelo comentario e pela visita.
obrigado, Maria, pelo comantario e pela visita!
"Se procurar bem você acaba encontrando.
Não a explicação (duvidosa) da vida,
Mas a poesia (inexplicável) da vida."
(Carlos Drummond de Andrade)
BOM FDS e beijos meus!!
Postar um comentário